Após três anos, a Johann Alimentos conseguiu na 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decisão inédita sobre créditos de insumo relativos ao PIS e à Cofins. Além de analisar a natureza do produto, o tribunal considerou, pela primeira vez, o tipo de atividade da companhia para reconhecer os créditos.
Atualmente, são inúmeras as ações que tramitam no Judiciário e discutem o que pode ser considerado insumo. O assunto é acompanhado de perto pelos empresários, pois os créditos gerados pelos insumos podem reduzir significativamente o valor a ser recolhido de contribuição – incidente sobre o faturamento da companhia.
No recurso julgado, a decisão autorizou o uso de créditos gerados pelas aquisições de combustíveis, lubrificantes e peças de reposição de veículos, necessários para a entrega de produtos pela companhia. O STJ considerou o fato de a empresa, além de comercializar alimentos, distribuí-los.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) entende que o recurso não deveria ter sido julgado agora, pois há um recurso repetitivo, a ser analisado em fevereiro, que trata do tema. A Corte, porém, entendeu que os processos tratavam de questões diferentes.
Além de ser distribuidora de alimentos, a Johann tem em seu objeto social, o transporte rodoviário de cargas. Esse ponto foi destacado pelo advogado que defendeu a empresa, Daniel Earl Nelson, da Lauffer Advocacia, e considerado pela maioria dos ministros.
O relator do processo, ministro Herman Benjamin, considerou irrelevante a discussão do conceito de insumo nesse caso. Para o relator, a Lei nº 10.833, de 2003, é clara ao dispor que os insumos que possibilitam ao contribuinte a obtenção de créditos estão relacionados à prestação de serviços e à atividade de produção ou de fabricação, não contemplando a simples comercialização de mercadorias. Para o relator, nessa situação, independentemente do conceito de insumo, a atividade desenvolvida pela empresa, comercialização de mercadorias, encerraria a discussão, não dando direito ao crédito.
Já o ministro aposentado, Cesar Asfor Rocha, manifestou voto divergente, afirmando que a empresa, além de ser distribuidora de alimentos, tem em seu objeto social, como parte dos objetivos, o transporte rodoviário de cargas em geral. “Sem dúvida nenhuma essa atividade integra o insumo da própria empresa”, afirmou em voto.
Após pedido de vista do ministro Herman Benjamin, o julgamento foi retomado em dezembro de 2014. Ao contrário da manifestação do relator, o ministro Humberto Martins afirmou que a solução desse caso requer necessariamente a análise do conceito de insumo. Para Martins, sendo o transporte rodoviário de cargas parte do objeto social da empresa, o conceito de insumo deveria, então, abranger as aquisições de combustíveis – tendo em vista que empresas transportadoras podem se creditar de PIS e Cofins incidentes sobre esses insumos.
“Não é razoável que a não cumulatividade do PIS e a Cofins somente seja utilizada em situações em que a empresa contrate serviço de transporte de terceiros sob pena de violação do artigo 150, II, da Constituição”, afirma em seu voto. O dispositivo veda o tratamento desigual entre contribuintes em situação equivalente.
O ministro Mauro Campbell Marques considerou que, no caso, estão presentes todos os pressupostos para o creditamento. “Trata-se de combustíveis, lubrificantes e peças utilizados na prestação de serviços de transportes, serviços, estes componentes do objeto social da empresa e cujo custo é transferido para o elo subsequente na cadeia econômica e cujo faturamento sofre a tributação pelas contribuições ao PIS e Cofins não cumulativas”, diz em voto.
As considerações dos votos proferidos em dezembro podem ser importantes para outros casos que discutem a mesma matéria nos tribunais, avalia Bruno Baruel, do escritório Baruel e Barreto Advogados. “O voto do ministro Humberto Martins abre uma possibilidade de creditamento um pouco maior, por falar de isonomia. É o ponto mais inovador desse voto”, afirma.
A decisão indica uma flexibilização do STJ em relação ao tema, avalia Fábio Pallaretti Calcini, do Brasil Salomão & Matthes Advocacia. “Até o momento, para o setor do comércio, tínhamos um posicionamento muito radical de negativa do crédito”, diz. Segundo ele, a decisão indica que quando envolver outra atividade, mesmo que acessória, é possível reconhecer os insumos.
Para o advogado Flávio Eduardo Carvalho, do Souza, Schneider, Pugliese e Sztokfisz Advogados, a decisão demonstra que o STJ tem uma visão menos restritiva que a Receita Federal. O escritório representa a empresa no recurso repetitivo a ser julgado pelo STJ.
A PGFN vai recorrer da decisão. A Fazenda afirma que ainda que a atividade de transporte de cargas esteja no contrato social da empresa, ela é meramente acessória à atividade principal. “Se o termo insumo for interpretado de forma ampla, o tributo se desnaturará, pois ao invés de incidir sobre a receita (consoante sua hipótese de incidência prevista constitucionalmente) estará incidindo sobre o lucro”, afirmou a PGFN, em nota. A procuradoria ressaltou que, apesar de existir decisões do STJ sobre insumo, cada caso pode refletir resultado diverso, pois para avaliar o direito ao crédito, é necessário avaliar sua atividade principal.
O Supremo Tribunal Federal (STF) ainda definirá o que pode ser considerado insumo, em julgamento com repercussão geral, sobre o assunto.
Fonte: Valor Econômico